Por que, com a idade, os anos passam voando como se fossem dias?
Você lembra como, quando criança, o verão parecia durar uma eternidade? Em um único dia no rio cabia uma vida inteira: manhã caçando caranguejo, tarde fumando o primeiro cigarro escondido atrás do muro, noite com fogueira e histórias de terror. E hoje? Segunda-feira… e de repente já é sexta; janeiro… e já é dezembro. Você não se tornou uma pessoa preguiçosa nem começou a “viver mal”. Seu cérebro simplesmente aprendeu a economizar energia.
Ele é, de fato, o órgão mais preguiçoso do corpo quando o assunto é gasto energético. Toda experiência nova exige um esforço monumental: ligar o hipocampo, criar novas conexões neurais e gravar detalhes. Já a rotina é o puro piloto automático. Comer o mesmo iogurte, pegar o mesmo caminho, rolar o mesmo feed de notícias. O cérebro olha para aquilo e pensa: «Já vi isso aqui. Não vou gastar energia processando». Resultado: no fim do ano sobram… umas três ou quatro lembranças marcantes. E a sensação é de que passaram apenas três meses.
Isso não é só impressão. É biologia.
A ciência do tempo subjetivo
Em 2005, o psicólogo Marc Wittmann e sua colega Sandra Lehnhoff publicaram um dos estudos mais citados sobre o tempo subjetivo. Eles entrevistaram pessoas de 14 a 94 anos e pediram para avaliarem quão rápido o tempo estava passando «agora» e «nos últimos 10 anos».
O resultado foi impressionante:
- Adolescentes diziam que os últimos 10 anos tinham sido extremamente lentos.
- Pessoas acima de 40 anos já sentiam que esses mesmos 10 anos tinham passado «num piscar de olhos».
Quanto mais velhos ficamos, mais o tempo acelera na retrospectiva. E o mais curioso: isso não depende de a pessoa achar a própria vida «interessante» ou «cheia». O principal preditor é a quantidade de eventos novos e claramente memoráveis.
Wittmann explica de forma simples: nós medimos o tempo não pelos segundos do relógio, mas pela quantidade de “âncoras” na memória. Quanto menos âncoras, mais curto parece o trecho vivido. Pesquisas sobre neuroplasticidade confirmam: quem regularmente faz algo completamente novo — como mudar o trajeto para o trabalho, experimentar uma culinária exótica ou aprender uma habilidade que temia — consegue “frear” o tempo subjetivo. Essas pessoas têm uma densidade maior de episódios marcantes guardados por ano do que quem vive no piloto automático.
O segredo da emoção
Mas tem um detalhe que muitos coaches motivacionais adoram ignorar. A novidade precisa ser emocionalmente significativa.
Só ir para um país novo e ficar no hotel assistindo Netflix não adianta. O cérebro vai dizer: «É a mesma coisa, só mudou a cor da parede». Agora, se você se perder nesse país, conversar com locais, comer com a mão algo que nunca pediria, brigar com o taxista e depois fazer as pazes tomando uma cerveja com ele… aí sim, fica gravado. Emoção + novidade = âncora poderosa.
E o mais legal: isso funciona até com coisas pequenas. O neurocientista David Eagleman (o mesmo que explica por que o tempo parece passar em câmera lenta durante acidentes) sugere que a quebra de padrão é fundamental. Se você passar um mês fazendo pequenas coisas fora da curva — ouvir um gênero musical que “não entende”, jantar à luz de velas numa terça-feira sem motivo — ao final, esse período parecerá muito mais longo e “denso” do que o mês anterior.
Ou seja, você não precisa largar tudo e ir para o Nepal (embora também seja uma opção). Basta, de vez em quando, fazer algo que dá aquele friozinho na barriga.
A armadilha do conforto
E aqui está a grande armadilha final. Quando envelhecemos, muitas vezes nós mesmos nos enfiamos na rotina buscando conforto. Pensamos: «Já experimentei tanto na vida, para que mais?». O conforto é inimigo da percepção do tempo. O cérebro interpreta o que é “confortável e conhecido” como “não importante, não precisa gravar”.
Por isso muitos aposentados que “finalmente podem fazer o que quiserem” reclamam que o tempo voa ainda mais rápido. Porque “fazer o que quiserem” acaba sendo ver a mesma série e ir ao mesmo mercado. Já aqueles que de repente se matriculam em aulas de dança, vão fazer voluntariado ou aprendem um instrumento aos 70 anos dizem que “se sentem jovens de novo”. E não é metáfora. O tempo subjetivo deles realmente se estica.
O que fazer agora mesmo?
Não precisa esperar segunda-feira nem o ano novo. Aqui estão algumas ideias pequenas e estranhas que realmente funcionam para criar novas âncoras:
- Entre numa cafeteria que você sempre ignorou e peça a coisa mais esquisita do cardápio.
- Puxe conversa com alguém que você normalmente ignoraria no ônibus.
- Faça seu trajeto habitual de trás para frente ou por ruas desconhecidas.
- Ouça um podcast numa língua que você não entende (só 10 minutos — seu cérebro vai ficar alerta tentando decifrar a novidade).
- Tire foto de algo que você nunca fotografa (como os texturas do chão ou sombras no teto).
Cada uma dessas pequenas atitudes é um prego onde o cérebro vai pendurar um: “Nossa, isso aconteceu!”. Daqui a um ano, você vai olhar para trás e pensar que o ano não passou voando. Ele foi vivido. Porque você se lembrou dele.
Referências
- Wittmann, M., & Lehnhoff, S. (2005). Age effects in perception of time. Psychological Reports.
- Friedman, W. J., & Janssen, S. M. J. (2010). Aging and the speed of time. Acta Psychologica.
- Arstila, V. (2012). Time slows down during accidents. Frontiers in Psychology.