O que é o amor, afinal? Pistas da filosofia para decifrar o sentimento mais complexo do mundo

Cada um de nós entende essa palavra à sua maneira. Alguns nem sequer acreditam em sua existência, reduzindo-o a meros processos químicos e a um sentimento de apego. Mas o que os grandes pensadores da história têm a dizer sobre isso? Por que a filosofia, a busca pela sabedoria, não pode prescindir do amor? Vamos explorar as múltiplas facetas deste sentimento universal.

As Muitas Palavras e Símbolos do Amor

A própria palavra "filosofia" nos dá uma pista da sua ligação íntima com o amor. Ela vem da junção de duas palavras gregas antigas: philia, que significa amor-amizade, e sophia, que significa sabedoria. Portanto, filosofar é, em sua essência, "amar a sabedoria". Em algumas tradições, o exercício filosófico era poeticamente chamado de "amor à sabedoria", capturando perfeitamente essa ideia.

Mas o grego antigo não se contentava com uma só palavra. Havia também ágape (amor altruísta), storge (amor familiar) e eros (amor romântico e passional). Cada termo carrega uma nuance própria. Philia, por exemplo, é um amor baseado na afeição e na escolha consciente, um sentimento elevado que podemos ter por um amigo, pela pátria ou, claro, pelo conhecimento.

Por que uma língua precisaria de tantos termos para um mesmo conceito? Culturas e línguas diferentes frequentemente necessitam de palavras adicionais para expressar com precisão ideias de grande complexidade. Existe a noção popular de que algumas línguas de povos que vivem em regiões de neve possuem inúmeras palavras para descrever os seus diferentes tipos. Embora muitos linguistas debatam essa teoria, a ideia central é válida: a linguagem se adapta para expressar as realidades de um povo. Na cultura chinesa, por exemplo, o pato-mandarim é um poderoso símbolo de amor. Essas aves simbolizam a união na luta contra as adversidades, e seu nome tornou-se sinônimo de um casamento longo, feliz e de cuidado mútuo. É um conceito tão específico que uma única palavra em português talvez não conseguisse capturar toda a sua profundidade.

Foi dessa mesma necessidade que surgiram os vários termos para o amor na Grécia Antiga. E foi também de lá que herdamos a expressão "amor platônico". Ela nasceu a partir dos diálogos do filósofo Platão, onde se discute um amor ideal e sublime, desprovido de paixões carnais.

As Cores do Amor: Uma Classificação Moderna

Avançando no tempo, o sociólogo canadense John Alan Lee, inspirando-se nos antigos gregos, propôs uma forma de catalogar o amor. Ele dividiu o que chamamos de amor em seis tipos distintos, atribuindo a cada um uma cor, como se fossem cores primárias que podem ser misturadas para formar novas tonalidades.

Os Tipos Principais:

  • Eros (Vermelho): O amor romântico e passional. Segundo Sigmund Freud, corresponde ao desejo pela vida, unindo a atração física e o instinto de autopreservação.
  • Storge (Amarelo): Um amor semelhante ao apego familiar. É um sentimento que cresce lentamente a partir da amizade e do companheirismo, onde o objeto do amor não é escolhido de forma súbita, mas já faz parte da nossa vida.
  • Ludus (Azul): O amor como um jogo, uma forma de entretenimento. É focado na conquista e no prazer, sem buscar um envolvimento profundo ou compromisso.

Os Tipos Secundários (Misturas):

  • Mania (Roxo = Eros + Ludus): O amor obsessivo. É marcado pela intensidade, pelo ciúme e por um desejo avassalador de possuir o outro, oscilando entre a euforia e o desespero.
  • Pragma (Verde = Storge + Ludus): O amor racional e prático. É baseado na conveniência e em interesses comuns, onde a lógica e a compatibilidade de objetivos se sobrepõem ao sentimento arrebatador.
  • Ágape (Laranja = Eros + Storge): O amor incondicional e altruísta. É o amor ao próximo, que se doa sem esperar nada em troca, tendendo ao sacrifício e ao cuidado.

O Amor na Balança dos Filósofos

Ao longo dos séculos, os filósofos debateram incansavelmente a essência do amor. Muitos o viam como uma forma de fusão. Gottfried Wilhelm Leibniz dizia que "amar é encontrar na felicidade do outro a sua própria felicidade". Uma ideia ecoada por Leon Tolstói, para quem amar significava "viver a vida daquele que se ama". Georg Hegel, um gigante do idealismo alemão, acreditava que a verdadeira naturez a do amor consiste em "renunciar à consciência de si mesmo", mas que é justamente nesse esquecimento que a pessoa se encontra e se possui pela primeira vez.

Essa ideia de fusão tem raízes profundas, como vemos no mito dos andróginos, contado por Platão. Ele descreve seres primitivos que uniam os sexos masculino e feminino. Por sua arrogância, foram divididos pelos deuses. Desde então, cada metade vaga pelo mundo em busca da sua outra parte para se sentir completa novamente. Graças a Platão, a ideia de encontrar a "alma gêmea" se enraizou em nossa cultura.

Mas nem todos viam o amor com bons olhos. O filósofo alemão Arthur Schopenhauer o considerava um grande obstáculo na vida, uma ilusão biológica a serviço da espécie que enche prisões e manicômios. Para ele, a crônica das paixões poderia ser facilmente acompanhada nos registros policiais.

Outros, como Immanuel Kant, refletiram sobre sua origem. Segundo ele, o amor não depende da nossa vontade; não podemos amar porque queremos, e muito menos porque devemos. Para Kant, um "dever de amar" é um disparate. Nosso dever, argumenta ele, é fazer o bem às pessoas, quer as amemos ou não. Curiosamente, ele sugere que, ao praticar o bem a alguém, acabamos por desenvolver amor por essa pessoa. Assim, o mandamento "ama o teu próximo como a ti mesmo" não significa que devemos primeiro sentir amor para depois agir, mas sim o contrário: devemos agir com bondade, e essa ação despertará em nós o amor e a humanidade.

E o que é mais importante: amar ou ser amado? O pensador dinamarquês Søren Kierkegaard escreveu que ser amado é o maior prazer que um ser humano pode experimentar. Já o escritor francês Albert Camus via as coisas de outra forma: para ele, não ser amado é apenas um infortúnio; a verdadeira infelicidade está em não amar.

Uma Conclusão em Aberto

No fim, talvez o amor seja de fato uma matéria sutil. É um sentimento humano universal, direcionado aos mais diferentes objetos – pessoas, ideias, lugares, a própria vida. Ele se expressa de inúmeras formas, mas todas parecem ter como base um desejo fundamental de conexão e união com esses objetos.

Psicólogos, poetas e filósofos quebraram a cabeça sobre sua natureza, mas ninguém chegou a um consenso definitivo. E talvez essa seja a sua beleza. O amor permanece um enigma, um convite à reflexão.

E para você, o que é o amor? Qual dessas abordagens filosóficas ressoa mais com a sua experiência?

Referências

Lee, J. A. (1973). The Colours of Love: An Exploration of the Ways of Loving. New Press.
Este é o trabalho fundamental do sociólogo John Alan Lee, onde ele introduz sua famosa tipologia do amor em seis estilos (Eros, Ludus, Storge, Mania, Pragma e Ágape). O livro detalha a pesquisa e os conceitos que deram origem à "teoria das cores do amor", fornecendo uma base sociológica e psicológica para a classificação apresentada no artigo.

Platão. O Banquete (ou Symposium).
Este diálogo platônico é uma das mais importantes obras filosóficas sobre a natureza do amor. Para o tema do artigo, é especialmente relevante o discurso de Aristófanes (geralmente encontrado nas seções 189c–193d, dependendo da tradução), que narra o mito dos andróginos e a ideia da busca pela "outra metade" para restaurar a unidade original do ser.

Kant, I. (1797). A Metafísica dos Costumes.
Nesta obra, especificamente na "Doutrina da Virtude" (Parte II), Kant explora os deveres éticos. Ele argumenta que o amor como sentimento (pathological love) não pode ser comandado como um dever. Em vez disso, o que se exige é a benevolência prática (practical love), ou seja, o dever de fazer o bem aos outros. Ele postula que o ato de fazer o bem pode, secundariamente, levar ao sentimento de amor (amor ao próximo). Esta é a fonte da distinção kantiana entre amor como sentimento e a ação moral, mencionada no artigo.

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