Por que pedir muitos conselhos pode arruinar completamente a sua decisão?

Artigo | Autocuidado

Em momentos de grande incerteza, quando o caminho à frente parece nebuloso e a insegurança bate à porta, a reação mais instintiva é buscar orientação. Procuramos pessoas que respeitamos, mentores e amigos, na esperança de que suas experiências iluminem nossas próprias encruzilhadas. Contudo, nesta busca por clareza, existe uma armadilha sutil e perigosa na qual muitos de nós caem: o excesso de conselhos.

O Labirinto das Opiniões Contraditórias

Imagine uma pessoa que, sentindo-se perdida e em pânico, decide pedir conselhos não a uma ou duas, mas a dez pessoas diferentes. A intenção é nobre: colher o máximo de sabedoria possível. O resultado, no entanto, é quase sempre o caos. Ao buscar dez conselheiros, ela não recebe um mapa, mas sim dez mapas diferentes, cada um apontando para uma direção.

O que agrava a situação é que, frequentemente, esses conselhos são mutuamente exclusivos. Pessoas inteligentes e bem-intencionadas podem oferecer orientações completamente opostas. Uma sugere audácia, a outra, cautela. Uma aponta para o caminho A, enquanto outra garante que o sucesso está no caminho B.

Isso aprofunda a confusão inicial e cria um novo problema, de natureza social e emocional. Ao escolher seguir um dos conselhos, a pessoa inevitavelmente ignora os outros nove. Os mentores que dedicaram tempo e energia para oferecer sua perspectiva podem, compreensivelmente, sentir que seu esforço foi em vão. Isso pode gerar um desgaste na relação, diminuindo a disposição deles em ajudar no futuro. A situação, criada pela própria pessoa em sua busca desesperada por ajuda, torna inevitável "desapontar" a maioria daqueles a quem recorreu.

Filtrando a Sabedoria: A Escolha Criteriosa dos Conselheiros

A lição aqui é a importância da moderação e do critério. A busca por conselhos deve ser um ato cirúrgico, não uma pesca de arrastão. Existem dois filtros essenciais para esse processo:

  • Relevância da Experiência: Busque o conselho de pessoas que já conquistaram o que você deseja ou que demonstraram maestria na habilidade que você quer desenvolver. A sabedoria deles não é teórica, mas vivida. Eles conhecem o terreno que você está prestes a pisar.
  • Limitação do Círculo: Limite drasticamente o número de pessoas a quem você pede ajuda. Duas ou três vozes cuidadosamente selecionadas são infinitamente mais valiosas do que dez opiniões dispersas. Isso minimiza o ruído e evita o dilema de ter que invalidar a ajuda de tantos.

A Pergunta Transformadora: "O Que Você Faria?"

Talvez a mudança mais poderosa não esteja em quem você pergunta, mas em como você pergunta. Evite a pergunta direta e passiva: "O que eu deveria fazer?". Ela coloca o peso da decisão no outro e o obriga a assumir uma postura de comando.

Em vez disso, adote uma pergunta muito mais perspicaz e profunda: "O que você faria se estivesse na minha situação?".

Esta abordagem é superior por duas razões fundamentais.

Primeiro, ela convida o conselheiro a um exercício de empatia e a dar uma resposta que reflete seus interesses e valores mais autênticos. Muitas vezes, o que as pessoas fariam por si mesmas não se alinha perfeitamente com o que elas dizem que os outros "deveriam" fazer. Há debates na área médica, por exemplo, que sugerem que os próprios médicos, por vezes, optariam por tratamentos diferentes ou menos agressivos para si mesmos em comparação com os protocolos padrões que poderiam recomendar a um paciente. Perguntar "o que você faria?" acessa essa camada mais honesta de pensamento.

Segundo, essa pergunta lhe dá mais autonomia. A resposta não virá como uma ordem direta, mas como uma sugestão, uma partilha de perspectiva. "Se fosse eu, eu faria X..." é uma declaração que você pode analisar, adaptar ou até mesmo descartar sem o peso de estar desobedecendo a uma instrução direta. Isso lhe concede o espaço psicológico necessário para ponderar e, no fim, tomar a decisão que é verdadeiramente sua. Afinal, o objetivo de pedir um conselho não é transferir a responsabilidade, mas sim ganhar clareza para poder assumi-la com mais confiança.

Referências para aprofundamento:

  • Schwartz, B. (2004). The Paradox of Choice: Why More Is Less. Ecco.
    Este livro explora a tese central de que, embora a liberdade de escolha seja fundamental para o bem-estar, uma abundância excessiva de opções pode levar à paralisia, ansiedade e insatisfação. A obra fundamenta a ideia apresentada no artigo de que pedir conselhos a muitas pessoas (aumentando o número de "escolhas" de ação) pode ser psicologicamente prejudicial e contraproducente.
  • Kahneman, D. (2011). Thinking, Fast and Slow (Publicado no Brasil como Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar). Farrar, Straus and Giroux.
    O trabalho do prêmio Nobel Daniel Kahneman é crucial para entender como a formulação de uma pergunta (o "enquadramento" ou framing) altera drasticamente a resposta. A distinção entre perguntar "O que devo fazer?" e "O que você faria?" é um exemplo prático do efeito de enquadramento. A segunda pergunta tende a evocar uma resposta mais pessoal e menos prescritiva, o que se alinha com os conceitos de heurísticas e vieses cognitivos descritos por Kahneman. A discussão sobre o "Sistema 1" (intuitivo) e o "Sistema 2" (deliberativo) ajuda a explicar por que a resposta a cada pergunta vem de lugares mentais diferentes.
  • Ubel, P. A., Angott, T. R., & Zikmund-Fisher, B. J. (2011). Physicians’ and the Public’s Perceptions of Treatment Decisions for Very-Low-Birth-Weight Infants. JAMA Pediatrics, 165(10), 895–900.
    Esta pesquisa, entre outras na mesma linha, ilustra a discrepância entre as decisões de tratamento que os médicos tomam para si ou para seus entes queridos e as que recomendam aos pacientes. Embora este estudo específico seja sobre neonatologia, o princípio é o mesmo mencionado no artigo sobre oncologistas. Ele valida empiricamente a ideia de que a perspectiva pessoal de um especialista ("o que eu faria por mim") pode ser diferente de sua recomendação profissional padrão, reforçando o valor de se perguntar "O que você faria no meu lugar?".